IA Ética: Sem Dados, Sem Credibilidade

Lia Raquel

Consultora especializada em Ética na Tecnologia, Estratégia, Sustentabilidade, Web3 e Impacto Social.

Os dilemas éticos futuros da Inteligência Artificial (IA) estão intrinsecamente ligados aos valores que incorporamos nos sistemas atuais, embora essa relação nem sempre seja reconhecida. Reduzir esta discussão à tecnologia significa ignorar o essencial: somos nós que criamos os sistemas de valores que a IA reflete. Se aceitamos, seja por influência do marketing ou não, que a IA continuará a ser uma das principais tendências para 2025, então temos de reconhecer que este progresso traz consigo novos desafios. Por isso, fortalecer as práticas éticas deve ser uma prioridade, e não uma opção. Embora as regulamentações estabeleçam bases importantes, elas não respondem a uma questão central: sem dados concretos, como traduzimos a ética na IA para a prática?

Afirmar que a IA deve ser responsável, equitativa, rastreável, confiável e governável corre o risco de se tornar uma tautologia se não houver mecanismos concretos para aplicar esses princípios. O verdadeiro desafio está em transformar essas diretrizes em princípios aplicáveis ao desenvolvimento e implementação da tecnologia, acompanhados por práticas de monitorização mensuráveis. Caso contrário, um bom desempenho estatístico poderá ser erroneamente tomado como prova de um funcionamento ético. Aqui reside uma lacuna significativa entre a adoção da IA e a implementação de diretrizes éticas concretas.

A operacionalização da ética na IA exige mais do que princípios abstratos – requer métricas concretas e mecanismos eficazes. Entre eles, auditorias regulares, comités de ética dedicados e indicadores específicos para medir o impacto dos sistemas. O Comité Europeu para a Proteção de Dados (EDPB) publicou a AI Auditing Checklist, um guia relevante para estruturar processos de auditoria e monitorização contínua. Mas sem indicadores claros, como garantir que os valores que queremos refletir na IA não se diluem na sua implementação?

Definir indicadores-chave de desempenho (KPIs) para a ética na IA é essencial para monitorizar aspetos como transparência (Explainability Score, Accountability Ratio); justiça e viés (Bias Score); conformidade regulatória (Ethical Standards Adherence, Ethics Compliance Rate) ; eficiência operacional (Audit Frequency and Results, Accuracy ). Estes KPIs não só mitigam riscos de decisões enviesadas, como também fomentam a criação de soluções tecnológicas confiáveis e justas. Além disso, a adoção destas métricas transcende a mera conformidade regulatória: alinha objetivos empresariais com valores sociais, promovendo sistemas eficazes, transparentes e responsáveis. Empresas que integram métricas éticas desde cedo reduzem riscos regulatórios, constroem produtos mais confiáveis e aumentam a aceitação do mercado.

Sem ética, a inovação é um risco, não um avanço. Num mercado exigente, lideram aqueles que demonstram o impacto ético e não apenas as intenções. Ainda que o valor da ética – no seu sentido amplo e reflexivo – não se reduza à mensurabilidade de dados quantificáveis, quando o compromisso ético exige ações concretas, impõe-se a pergunta: afinal, qual é o valor de um compromisso ético em IA se não pode ser medido?

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