Conversa entre filósofos – mero divertimento ou intencionalidade didática relevante?
Steve Jobs, em 1985, numa universidade em Estocolmo, na Suécia, ao apresentar o seu novíssimo e revolucionário computador Apple Macintosh, imaginava um futuro hipotético, em que as pessoas poderiam conversar com um computador, configurado como se fosse uma figura relevante da história, por exemplo Aristóteles.
Jobs, na sua digressão discursiva plena de criatividade e genialidade, não fazia a mais pequena ideia de que estava a prever a Inteligência Artificial Generativa.
Fica aqui o vídeo deste momento único, legendado (através de inteligência artificial – webapp: http://happyscribe.com/): steve_jobs_aristoteles_chatgpt.mp4.
Hoje, com a IAG (Inteligência Artificial Generativa), não só o professor pode colocar os alunos a conversar com Aristóteles, como pode colocar Aristóteles a conversar com Platão. Deixo, aqui, esta proposta didática.
Num navegador, temos uma conta com o ChatGPT. Noutro navegador, temos uma conta com o Copilot:
Aristóteles → ChatGPT
Platão → Copilot
Obviamente que esta distribuição é por mera conveniência e arbitrária. O importante é que se configurem os chatbots para assumirem um papel, neste caso o de Platão e o de Aristóteles. Depois de configurados, o prompt que se coloca em cada um dos chatbots é a resposta que o outro filósofo dá, no outro chatbot. Assim:
Aristóteles (ChatGPT) | Platão (Copilot) |
1.º prompt:
1.º output (resultado ou saída do chatbot) Platão, meu caro, a ética não reside apenas nas ideias, mas também nas ações concretas. A virtude é um hábito, algo que cultivamos através da prática constante, não apenas uma abstração. Como vês isso? 2.º prompt: Caro Aristóteles, compreendo a tua perspetiva sobre a ética como prática constante. No entanto, acredito que a virtude e a ética começam nas ideias e na compreensão do bem. As ações concretas são, sem dúvida, essenciais, mas são guiadas por uma visão clara do que é justo e bom. A prática sem uma base filosófica sólida pode levar a ações sem direção moral. Como vês a importância da filosofia na formação dessas virtudes? 2.º output (resultado ou saída do chatbot) Platão, tens razão ao afirmar que a compreensão do bem é essencial. No entanto, o conhecimento teórico, por si só, não é suficiente para garantir uma vida virtuosa. A filosofia oferece a base, sim, mas é na repetição das ações justas que a virtude se enraíza. Podes saber o que é o bem, mas se não o praticares, esse conhecimento torna-se estéril. Não será a filosofia, então, um meio para alcançar a virtude, mas não o fim em si? … | 1.º prompt: Vais ser o filósofo Platão. Vais ter uma conversa com Aristóteles. Ele vai conversar contigo, de forma animada, sobre ética. Usa apenas português europeu. Aguarda a primeira ideia que Aristóteles te vai enviar. Escreve pouco porque estás a conversar.
2.º prompt: Platão, meu caro, a ética não reside apenas nas ideias, mas também nas ações concretas. A virtude é um hábito, algo que cultivamos através da prática constante, não apenas uma abstração. Como vês isso?
1.º output (resultado ou saída do chatbot) Caro Aristóteles, compreendo a tua perspetiva sobre a ética como prática constante. No entanto, acredito que a virtude e a ética começam nas ideias e na compreensão do bem. As ações concretas são, sem dúvida, essenciais, mas são guiadas por uma visão clara do que é justo e bom. A prática sem uma base filosófica sólida pode levar a ações sem direção moral. Como vês a importância da filosofia na formação dessas virtudes? 3.º prompt: Platão, tens razão ao afirmar que a compreensão do bem é essencial. No entanto, o conhecimento teórico, por si só, não é suficiente para garantir uma vida virtuosa. A filosofia oferece a base, sim, mas é na repetição das ações justas que a virtude se enraíza. Podes saber o que é o bem, mas se não o praticares, esse conhecimento torna-se estéril. Não será a filosofia, então, um meio para alcançar a virtude, mas não o fim em si? … |
O professor projeta a imagem do ecrã do seu computador, colocando os navegadores um ao lado do outro, como na imagem abaixo:
Qual a intencionalidade didática desta atividade? Qual o seu objetivo?
Ora, o exemplo não é o melhor, pois o currículo nacional português atual prevê a abordagem de outros filósofos, a propósito da ética: Kant, Mill, Rawls, Sandel, Nozick) – Aprendizagens Essenciais de Filosofia, 10.º ano). No entanto, basta trocar os filósofos, na parametrização inicial dos chatbots. A partir daí, os alunos poderão apreciar a conversa entre os pensadores e fazer juízos de valor, cumprindo, também, o preconizado no currículo de Filosofia e respetivas ações estratégias, por exemplo (transcrições das Aprendizagens Essenciais de Filosofia, 10.º ano, documento da tutela orientador do currículo da disciplina):
«Clarificar as teses e os argumentos […]»; «Elaboração colaborativa de um esquema síntese com as teses e argumentos […]»; «Confrontação de teses e argumentos […]»; «Caracterização pelos alunos […] das teses e dos argumentos de cada uma das posições relativas à natureza dos juízos morais.»; «Discutir criticamente […] posições e respetivos argumentos»; «Identificação justificada, individual ou colaborativamente, em textos de opinião sobre controvérsias relevantes no momento, de posições que sejam exemplo de cada uma das teses.», etc.
Ou seja, os alunos não ficam passivamente a observar a dança de argumentos entre os dois chatbots. A dado momento, decidido pelo professor, os alunos apreciam criticamente e atuam sobre os textos produzidos pelos chatbots, enquanto estes assumiam as suas persona e retorquiam aos prompts um do outro.
O único papel do professor (ou de um aluno) é o de copiar e colocar o output de cada chatbot para alimentar o outro. Apresentadas as ideias, haverá matéria para que os alunos manipulem a informação de acordo com as orientações curriculares, criticando os chatbots, estruturando as ideias apresentadas pelos filósofos.
Assim, na aula, os alunos estarão, ainda, a cumprir e a materializar uma das áreas de competências do Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória (documento orientador dos currículos de todas as disciplinas) – o pensamento crítico: «[…] observar, identificar, analisar e dar sentido à informação, às experiências e às ideias e argumentar a partir de diferentes premissas e variáveis.»; «pensar de modo abrangente e em profundidade, de forma lógica, observando, analisando informação, experiências ou ideias, argumentando com recurso a critérios implícitos ou explícitos, com vista à tomada de posição fundamentada;» (transcrições do documento do Perfil dos Alunos).
Aristóteles (ChatGPT) conversa com Platão: https://chatgpt.com/share/74e9ec74-a4a7-40b3-8de4-e7d6656e8703
Platão (CoPilot) conversa com Aristóteles: https://copilot.microsoft.com/sl/blfWBxM6P9M